sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Crônica Premiada

O Perdão
Mais uma vez a tristeza se tornava presente em sua vida por mais um desvio de conduta do marido Oswaldo: fora mandado embora do emprego suspeito de desfalque no caixa da firma.

Ela, Maria, não entendia; afinal, em casa não havia aportado dinheiro algum; como ele pudera ter roubado alguma coisa?

Ele, por sua vez, se fechava em copas e só insistia que era perseguição pessoal.

Não havia tempo para curtir o desapontamento, as contas continuavam a cair com a frequência de um trem britânico. Com algum esforço, ela conseguiu que seu chefe entendesse a necessidade de fazer horas-extras e com mais esforço ainda fez com que ele entendesse que isso não era motivo para dar em cima dela.

“- Sua mulher acabou de ligar; simpática ela, tivemos uma conversa amiga.” - era um dos artifícios para lembrá-lo de que ela estava atenta e ele parasse com gracinhas.

Numa determinada ocasião ele elogiou seu vestido – acaso um ligeiramente decotado – recebeu como resposta a frase: “- Sabe Seu Nelson, eu não sei lidar muito bem com esse tipo de elogio”.

Em casa, seu consagrado marido sempre era encontrado dormindo no sofá somente de cuecas, dia após dia. Não lavava a louça, não fazia comida, não passava um pano no chão, porque isso o deprimia. Jurava que havia saído para procurar algum emprego. Todavia, a barba por fazer indicava que ele estava mentindo.

Por sua vez, ela chorava baixinho pelos cantos aonde ninguém pudesse ver, pois não queria dar o braço a torcer. Não dizia blasfêmias e só tinha em Deus o apoio que precisava.

Um determinado dia ouviu uma colega fofocar com outra que seu Oswaldo era um desajustado e vivia às custas dela. Ainda sob impacto daquela frase mal dita ouviu da outra que “com um marido assim bonitão eu também dava casa, comida, roupa lavada e beijinho na boca, sem reclamar”.

Foi numa terça-feira de maio que seu mundo praticamente desabou. Ouviu do chefe que o setor passava por reformulações e que ela deveria procurar a Seção de Pessoal. Lá receberia ajuda para conseguir emprego em outra firma: “- Nós consideramos bastante você e seu trabalho e lhe ajudaremos com o que for possível” - ouviu do patrão que, certamente, colocara naquela demissão toda a raiva por sua rejeição.

Chegou em casa com o rosto enrugado de tantas lágrimas e, para sua surpresa, encontrou o marido com uma mulher, fazendo amor no seu sofá cujas prestações ainda não acabara de pagar.

Aos gritos atirou tudo que estava à mão nos dois e como resposta levou uma surra dele, para “se colocar no seu lugar”.

Junto com os cacos dos sentimentos, juntou uma pequena mala de roupa e foi para a casa da irmã, único porto seguro que achou que lhe restava. Entretanto, logo percebeu que não aguentaria ouvir todas aquelas frases como “eu te avisei que ele não prestava” e imaginou que sua vida havia aportado no inferno.

Os dias que se passaram foram dedicados a arrumar um novo emprego e as propostas não eram lá grande coisa.

Do marido recebeu diversos telefonemas e pedidos de perdão.

Voltou para sua casa, mas manteve distancia do bruto, dormindo em quarto separado e trancado a chave.

No dia em que finalmente saiu da empresa, um mês depois da “tarde terrível”, encontrou com um velho amigo de escola e este lhe falou que ia para o Paraná trabalhar numa montadora de carros que ali se estabelecera.

Ele também recordou que ela sabia francês e sugeriu que fosse lá tentar alguma coisa.

Nem titubeou; pegou o ônibus e enfrentou as entrevistas. Foi a melhor decisão que tomara, conseguiu o emprego, ganhando mais e com melhores condições do que o anterior.

Ao retornar para casa tomou outra surra “para aprender que devia satisfações ao marido”.

Foi para no hospital e no dia seguinte recebeu a visita do Oswaldo, com direito a flores e mais pedidos de perdão.

Ao ter alta ligou para o novo emprego, relatou que estivera hospitalizada e perguntou se a vaga ainda era sua. A resposta foi positiva.

Certificou-se que o marido não estava em casa e lá chegando, pôs tudo o que conseguiu em duas malas e partiu.

Quando o Oswaldo chegou em casa à tarde encontrou um bilhete perfumado e escrito com letra cursiva, bem caprichada:

Eu te perdoo.

Um comentário:

Claudio Trujillo disse...

Parabéns Oncinha!

Mai uma para a coleção.