sexta-feira, 5 de junho de 2009

Maravilhas da vida moderna

Antes de mais nada devo confessar que adoro compartilhar mensagens que trazem decalcomanias e propagandas como, por exemplo, Drops Dulcora, DKW ou Biotônico Fontoura. São muito alegres e com elas reavivamos nossas lembranças.
Dia desses, porém, recebi uma mensagem mais que saudosista, onde o autor declarava que os velhos tempos é que eram bons e lançava alguns desafios aos jovens, julgando-os incapazes de viver a felicidade tal qual os antigos faziam.
Não gosto nada dessas coisas, pois os jovens, que já tem um monte de problemas com falta de emprego, violência, afetivos, ainda ficam com um magoado lhes buzinando uma mensagem subliminar que diz, literalmente, que são incapazes e infelizes.

Pois bem, eu vou recordar algumas coisas que eu vivi.
Pasmem, mas me recordo plenamente da minha casa e do sítio do Tio Rocha iluminados em diversas ocasiões com lampiões de querosene e lamparinas a óleo que enchiam a casa com uma negra fuligem. Ao acordar, tínhamos uma sujeira negra nas narinas e brincávamos que eram bigodes.

Andei e tomei chuva num bonde que era aberto de um dos lados. Muita gente me garante que esse tipo de bonde não existia, que era aberto dos dois lados e que, na verdade, eu teria andado no bonde camarão, assim chamado porque era vermelho. Minha memória das coisas de infância é extremamente mais solida que minha memória de hoje em dia. Lembro da chuva que caía na antiga e hoje inexistente Praça Clóvis Bevilácqua.
Querem saber, prefiro o metrô, sequinho.
Recordo ainda uma visita que fiz à minha avó, em Candido Mota, quando tinha cinco anos. Para tomar banho foi necessário aquecer a água numa caneca no fogão à lenha, colocá-la no balde com uma pequena corrente que abria e fechava a torneira colocada na parte de baixo e desembocava em um chuveirinho.
Este ritual acontecia porque a grande facilidade da casa estava com problemas. A água descia por gravidade da caixa principal, passava num cano por trás do fogão e, aquecida, subia até a uma pequena caixa d’água com ligações para o balde/chuveiro e uma torneira que havia na cozinha e era usada para ajudar a desengordurar a louça.
No segundo dia da viagem minhas aventuras ao banho terminaram em parte, já que meu pai desentupiu o encanamento e não necessitava mais aquecer a água na caneca.

Querem saber, prefiro os chuveiros de hoje em dia, muito mais práticos e nos proporcionam banhos longos quando a cabeça necessita se recuperar de alguma tristeza.

Era morador do subúrbio do Chora Menino e nossa rua não era pavimentada. A cada chuva - e chovia quase todo dia - necessitava levar os sapatos limpos em um saco plástico – que não era fácil conseguir – para trocá-los quando chegávamos aos paralelepípedos da Alameda e os sapatos cheios de barro, precariamente limpos, eram guardados na sacola até a volta. As pessoas pediam o dono do bar na ponta da rua para lá deixarem os sapatos até a volta dos compromissos. Lá ficavam, às dúzias, sem cobrança, sem queixas; era gentileza mesmo.

Querem saber, não tenho saudades dos bons tempos enlameados da minha rua.

Também o Correio não chegava até nossa casa e nossas cartas eram mandadas para a casa de uma tia que vivia perto do quartel do CPOR. Era essa tia que também recepcionava as mensagens urgentes porque não tínhamos telefones na nossa rua. Quando os correios e as linhas telefônicas chegaram à nossa casa, foi uma festa. A Caixa de Correspondência passou a ser um item de destaque nobremente alojada ao lado dos portões.
Já o aparelho telefônico foi colocado em um ponto nobre, central, acessível e visível a todos, nativos e visitas. Facilitava o acesso, mas era péssimo para se namorar.

Querem saber, também não tenho saudades dos bons tempos em que não podia dizer coisas maliciosas para minhas amigas e obscenas para meus inimigos.

Uma modernidade, entretanto, resolvi aposentar por plena incompatibilidade: meu corretor automático de texto. Fica me enchendo a paciência com coisas do tipo:
“Uma modernidade, entretanto, resolveu aposentar” ou “Umas modernidades, entretanto, resolveram aposentar”;
E também:
“e-mail é neologismo inadequado. Altere a expressão para mensagem ou texto”;

Ou ainda
“esta frase contem 55 palavras. Deveria conter 50.”;
Pergunto quem definiu que uma frase deve conter menos de 51 palavras? Bill Gates?

Propõe correções absurdas ou deixa de fazê-las, como a que aconteceu na minha última crônica, alterada graças à ajuda providencial dos meus amigos Rufino e Lauro, além de outros comentários posteriores: Num determinado parágrafo ao invés de “referirem” apareceu “refirão”. Se fosse “refiram” seria um erro de concordância meu; mas não.
Confesso minha falha ao transferir o texto do Word para o Blog sem corrigi-lo detidamente.
E Rufino, assumo que também errei na grafia da palavra discriminar.

Querem saber, acho que vou ficar sem essa modernidade.
Ah! Que saudade dos bons tempos da correção com o lápis vermelho.



Aceitam uma Cuba Libre?

Dedicada aos amigos Rufino e Lauro, e também ao Maurinho, por seus 20 anos.

4 comentários:

Fabiano disse...

Quem sabe escrever, escreve. Quem não sabe, aplaude! Seguem meus aplausos!

Arnaldo Onça disse...

Gracias Señor! Ha garantizado su Cuba Libre.

Unknown disse...

Arnaldo,
gostei do comentário sobre o corretor de texto; "Billy the Gates" quer interferir até nisso?(rsrsrs).

A modernidade deixou todos mais individualistas e fracos de espírito; prefiro sentir o cheiro de praia e mato e andar descalço, bem em contato com meu lado primitivo, do que ter o último celular, embora goste disso também.

Grande abraço,
Ohannes Bedoyan
www.blogdoohannes.com.br

Arnaldo Onça disse...

Olá Ohannes!

A modernidade não é ruim se não nos deformar a personalidade.
Quer coisa melhor que a máquina fotográfica digital?
Abraços
Arnaldo